sexta-feira, 20 de maio de 2011

Oxi: uma droga pior do que o crack

Rede bom dia http://www.abead.com.br/midia/exibMidia/?midia=7527

O oxi mostra seus efeitos logo na primeira semana de consumo. Com vômito e diarreia frequentes, alguns viciados podem perder até 10 kg em menos de um mês. O usuário apresenta problemas no aparelho digestivo, complicações renais, além de dores na cabeça e náuseas, que se tornam constantes. As gengivas são perfuradas e os dentes danificados (ficam porosos e podem cair).
As substâncias do oxi atingem principalmente o fígado, a faringe e os pulmões. “Praticamente todas as via respiratórias sofrem um grande comprometimento, o que pode levar à morte rapidamente alguém que tenha asma ou algum problema cardíaco”, afirma Marta Jezierski, diretora do Cratod (Centro de Referência de Álcool, Tabaco e Outras Drogas), ligado à Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo.
Assim como o crack, o oxi é feito a partir da pasta base da cocaína e passa por um processo no qual outros produtos são acrescentados para se obter a pedra. O crack vem da mistura com amoníaco e bicarbonato de sódio, enquanto o oxi é feito com cal virgem, combustíveis (querosene, gasolina ou diesel) e outros oxidantes (daí a origem do seu nome), como explica Ana Cristina Fulini, especialista em dependência química da Clínica Maia Prime, em São Paulo: “São produtos mais baratos, que reduzem bastante o preço da droga, tornando-a uma alternativa para o usuário de crack”.
Embora a droga só tenha sido apreendida pela polícia recentemente, relatos apontam que o oxi já é bastante popular no norte do país, principalmente no Acre e no Amazonas. Chegou à capital de São Paulo nos últimos sete meses e tem sido amplamente usada entre viciados em crack. “Os pacientes informam sobre um tipo de pedra de crack mais barata e com efeito mais forte desde o ano passado”, conta Ana.
Um fator que contribui para rápida adesão do usuário é a concentração de cocaína, mais alta no oxi, chegando a 80%, embora a pureza seja menor em consequência do excesso de ingredientes. O crack apresenta uma concentração de 40%. Essa diferença também torna o efeito do oxi mais rápido e potente, aumentando a sedução para o uso.
Segundo Marta Jezierski, os usuários de oxi em São Paulo consomem a droga pensando ser crack. “Na hora da fissura, dificilmente essas pessoas se perguntam o que é, alguns só sabem que é mais barato e forte”, diz ela, alertando para o fato de que o oxi, em comparação com o crack, aumenta a paranóia e os surtos psicóticos.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Congressos e livros discutem como lidar com a loucura na sociedade atual

RIO - Como fazer da loucura uma marca pessoal e intransferível? Como fazer para que o que não se socializa seja reconhecido? Este fim de semana, o IX Congresso da Escola Brasileira de Psicanálise (EBP), em Tiradentes (MG), discute estas e outras questões. Em junho, no Rio, o V Encontro Americano de Psicanálise de Orientação Lacaniana (Enapol) reunirá 1.200 psicanalistas para tratar do tema "A saúde de todos, não sem a loucura de cada um", discutindo como fazer para que o singular deixe sua marca no universal.
Uma das estrelas dos dois eventos é o psicanalista, psicólogo e doutor em Psicanálise francês Éric Laurent, membro da École de la Cause Freudienne (ECF), da EBP, da Associação Mundial de Psicanálise (AMP) e autor de mais de 270 referências em francês, com artigos e capítulos de livros traduzidos para outros sete idiomas. Este fim de semana ele lança o livro "Loucuras da Vida Cotidiana" em Tiradentes e, em entrevista a O GLOBO por email, falou sobre loucura, felicidade, redes sociais, sociedade e vida contemporânea. Para ele, a satisfação máxima, gozo atual da sociedade, "é um imperativo tão destruidor como foi a repressão na época vitoriana".
O GLOBO: O que é "ser" normal?
ÉRIC LAURENT: É ser "louco", como todo mundo, mas à sua maneira, a de cada um não é a do vizinho. A felicidade comum não existe, cada um tem as particularidades do seu mundo e o que o faz enlouquecer.

O GLOBO: Hoje as pessoas se consideram mais normais ou anormais? Baseadas em quê estabelecem esses critérios?

LAURENT: Nosso mundo foi invadido pelo ciframento de toda atividade humana: as estatísticas, os indicadores quantitativos, a pressão para ser avaliado produz um duplo efeito. Por um lado, reconhecer a particularidade de seu estilo de vida como "normal" seja qual for sua estranheza. De outro lado, ser reconhecido como exceção à regra, como uma pessoa.

O GLOBO: Por que nos sentimos tão desconfortáveis com nossas loucuras?

LAURENT: Pela pressão conformista de ser "um homem sem qualidades" como dizia (Robert) Musil.

O GLOBO: Quando o senhor fala que a satisfação máxima é o gozo atual da sociedade, essa satisfação tem a ver com felicidade?

LAURENT: A felicidade sempre foi concebida como harmonia. A necessidade imperiosa de obter uma satisfação de gozo maximizada sempre ultrapassa os padrões de felicidade. E além de ser feliz, não há mais.

O GLOBO: Em que medida essa satisfação máxima contribui para esse desconforto?

LAURENT: Porque é um imperativo tão destruidor como foi a repressão na época vitoriana.

O GLOBO: Como o senhor acha que as pessoas lidam com as frustrações e decepções em uma sociedade que cobra sorrisos o tempo todo?

LAURENT: Esta sociedade que "cobra sorrisos" é cruel e violenta. Ser carioca é saber lidar com isso de uma certa maneira, com o Carnaval por exemplo. Além da identidade coletiva, cada um encontra seu carnaval particular que é seu sintoma. Um sintoma é feito da imposibilidade de uma identificação única. Cada um é múltiplo.

O GLOBO: A superexposição atual tem a ver com isso, já que todos estão acessíveis nas redes sociais, precisam estar bem, sorridentes, realizando e adquirindo coisas?

LAURENT: As redes sociais são formas de se reconhecer como os demais, apesar da angústia de que não se é. O paradoxo é que uma rede social pode ser uma maneira extraordinária de atuar ao contrário da padronização identificatória. Pode servir para atuar contra as normas e o poder. O Facebook pode favorecer uma epidemia de rebeldia como se viu no Irã e no Oriente Médio.

O GLOBO: Como o senhor observa o comportamento das pessoas online e na vida real? Não é muito diferente?

LAURENT: As redes sociais mais interessantes para um psicanalista são as redes de encontros. As diferenças entre o papel desempenhado por cada um e a maneira particular com a qual se produz o desencontro é muito notável. Quando digo desencontro, isto inclui os casos nos quais o encontro desemboca em parceiros estáveis.

O GLOBO: Para onde o senhor acha que vamos caminhar a partir daqui? Esses conceitos e filosofia de vida vão se potencializar ou poderá haver uma ruptura nesses padrões?

LAURENT: Vamos padecer mais a cada dia dos paradoxos das loucuras cotidianas, tratando de encontrar nossas soluções, uma por uma.

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domingo, 1 de maio de 2011

A loucura que estrutura

Resenha das preparatórias do V ENAPOL

Dia: 15 de abril, 18h30

Local: Maison de France - Av. Presidente Antônio Carlos, 58/11° andar – Castelo - RJ
Com: Ana Lúcia Lutterbach e Paula Borsói
Coordenação: Luis Moreira Barros

Paula Borsói inicia o debate ao retomar a discussão que ocorreu na última segunda-feira na sede da EBP-RJ sobre o massacre numa escola em Realengo.
Diante desses acontecimentos, em que a palavra fica perdida em detrimento das ações, ou melhor, da passagem ao ato, como a psicanálise se posiciona diante disso?
A psicanálise pura se aproxima da psicanálise aplicada, na medida em que nos permite fundamentar uma discussão sobre está temática. Assim, Paula Borsói cita Lacan, que ao retomar os estudos de Freud, pôde definir o inconsciente estruturado como uma linguagem, até alcançar as proposições sobre o Real, Simbólico e Imaginário – RSI. A psicanálise como impossível, se coloca como tal na medida em que há um ponto irredutível do sintoma.
Chamados a nos posicionar diante desta tragédia, nós, enquanto psicanalistas que trabalham na saúde mental, enquanto analista-cidadão, o que podemos aí?
Paula Borsói pontua que não devemos permitir que esta tragédia vire um circo, ou seja, devemos evitar que atitudes narcisistas tomem o lugar de atitudes solidárias. Assim, a loucura que estrutura, tema do presente debate, seria algo que permite ao sujeito levar a vida, num pólo diametralmente oposto da passagem ao ato.
O debate teve seqüência com a fala de Ana Lúcia Lutterbach, que buscou localizar alguns pontos do V Enapol, na medida em que os trabalhos a serem apresentados no evento irão trabalhar a questão do que a psicanálise, ou o psicanalista, pode nesse novo contexto social.
Ana Lúcia Lutterbach assinala que a psicanálise tem um pouco mais de 100 anos, diferente da filosofia ou da literatura. Destaca três pontos na história da psicanálise: a diáspora, a reconquista e a invenção. A diáspora localiza que a psicanálise deixou sua pátria tentando se adaptar a língua do outro, e que, desta forma, se egoizou.
Lacan se deteve nisso que havia se perdido, através do resgate que fez de Freud. Deste modo, a reconquista veio com Lacan ao restabelecer a psicanálise com o destaque ao registro do Real; e também com Miller ao trazer os novos impasses e desafios da psicanálise no contemporâneo, qual seja o empuxo ao gozo, ao excesso, e ao mais ainda.
No contemporâneo imperam e ploriferam as soluções terapêuticas rápidas, muitas vezes através de medicamentos que deixam o sujeito de fora.
A fim de ilustrar a diferença entre as terapias que desconsideram o sujeito, e o gozo, e a psicanálise, que defende o inconsciente, Ana Lúcia Lutterbach apresentou uma vinheta clínica: Uma mãe que vai ao consultório dizer que o filho é anoréxico: “ele só come o que gosta”. Segundo uma observação psicanalítica se tratava de uma demanda materna. Havia aí um impasse pulsional que a psicanálise trata ao considerar a singularidade do caso a caso. A psicanálise proporciona, assim, uma salvação pelos dejetos, pelos restos do psíquico, de modo que o sujeito tem a chance de se salvar servindo-se do sintoma. A psicanálise coloca em evidencia a loucura de cada um a fim de privilegiar a inventividade sintomática.
Seguiu à discussão o debate com o público, onde se pontua a responsabilidade do analista cidadão, na medida em que ele atua no social, em escolas, no campo jurídico, e na saúde mental. Diz-se que o autor do massacre na escola de Realengo não foi escutado, pois nem a sociedade nem os profissionais da escola teriam percebido que ele apresentava uma doença mental, e como tal, deveria ter recebido um encaminhamento para ser tratado.
Ana Lúcia Lutterbach pontuou que podemos dizer que este rapaz era louco, contudo devemos ter cuidado para que essa discussão não resvale para um novo encarceramento dos loucos. Esse ato cometido pelo rapaz seria uma loucura crua, uma passagem ao ato, pois ele estava imerso na loucura, o que é diferente de uma loucura que estrutura. Esse acontecimento demonstra como um ponto de real, que não é explicável ou simbolizável, se não for tratado pode levar a passagem ao ato.
Chamou-se atenção para o fato de que na tragédia convocaram-se muitos psiquiatras para diagnosticar e dar um sentido para isso, ao dizer “ele é louco”. Contudo, a tragédia revela um sem sentido, porque é da ordem do real.
O trabalho da psicanálise seria, então, na margem, na beira, e não sobre o acontecimento propriamente dito. Pois, isso é algo que não se pode prevenir, é o risco da presença do real. Não é possível estabelecer uma causa. O que existem são as contingências, e o que o psicanalista pode diante disso não é da ordem de atribuir uma causa, ou de prometer uma prevenção, mas sim de oferecer uma escuta ao sofrimento psíquico dos sujeitos, para que este possa dar um tratamento ao real, a isto que não tem sentido.

Por: Júlia Reis