sábado, 26 de fevereiro de 2011

As surpresas de uma fala: as formações do inconsciente e seus efeitos com relação às identificações exigidas pelo mestre contemporâneo.

Por Iordan Gurgel (EBP)

Na contemporaneidade com os fenômenos da chamada globalização, muitas foram as mudanças ocorridas, a partir dos movimentos sócio-políticos que acabaram recaindo sobre as novas formas do funcionamento social e que tem reflexos na posição subjetiva de cada um. Com o avanço da biologia molecular, a prática da medicina baseada em evidências, o apelo às neurociências e, ao mesmo tempo, o fracasso frente aos ideais de saúde para todos, a psicanálise é convocada a mostrar seus efeitos quando aplicada ao social, especialmente no campo da saúde mental. Associa-se a esta demanda uma nova realidade quando, mais além da psicofarmacoterapia, se institucionalizam os novos dispositivos assistenciais para enfrentar os “loucos de toda ordem”, os bipolares, os compulsivos, os toxicômanos, os bulímicos, os anoréxicos, os hiperativos e outros – estes gozadores marginais que radicalizam sua autonomia do Outro e vão contra os imperativos de ter que gozar cada vez mais.

A resposta da psicanálise, desde seus princípios norteadores, é não reconhecer um programa de gozo para todos. O gozo está atrelado à contingencia, tem a ver com um encontro. Aí está a surpresa, o escândalo: o gozo não está generalizado; não é para todos iguais.

Mas, se a psicanálise tem efeitos terapéuticos é porque reconhece a singularidade do desejo e não porque conduz à norma do para todos. O seu compromisso é com a norma singular do desejo mesmo se isto representa um desvio em relação as normas sociais. Para o discurso do mestre o desejo é padronizado e os ideais são comuns a todos, enquanto a psicanálise se rebela contra o todo mundo, o para todos e respeita o desvio singular e o direito do um só.

Reconhecer sua clínica como standard (conjugar os aprendizados da clínica com neuróticos com suas identificações com a clínica das psicoses e os arranjos conseqüentes a não identificação ao Nome-do-Pai), e possibilitar ao sujeito a experiência da falta a ser, através da quedas das identificações e a conseqüente autonomia frente ao Outro; reconciliar o sujeito com seu gozo; se comprometer com a norma singular do sujeito e saber da sua debilidade para realizar sua inserção social, são os desafios impostos ao analista lacaniano que não se autoriza como modulador da sugestão social.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Programas para ajudar dependentes químicos criam demanda de profissionais

Correio Braziliense

Salários para quem tem especialização chegam a R$ 15 mil.

O uso de entorpecentes é uma das mazelas que mais preocupam as autoridades e a sociedade brasileiras. Segundo dados do Relatório Mundial sobre Drogas 2010, divulgado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc), estima-se que 900 mil pessoas no país sejam usuárias de cocaína e 650 mil de opiáceos (derivados do ópio). O censo dos viciados em crack não foi contemplado no estudo, mas é certo que a substância ilícita mais devastadora do Brasil já destruiu milhares de famílias.
Os números preocupam os governos estaduais e o federal, que começaram a traçar políticas para a redução de dependentes e, consequentemente, para o tratamento deles — uma delas é a criação do Plano de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas, do Ministério da Saúde e de parceiros. Isso exigirá, a partir deste ano, que psicólogos, psiquiatras, enfermeiros, clínicos gerais, assistentes sociais e outros profissionais de áreas afins invistam em especializações voltadas para a atuação em projetos de diminuição do consumo de entorpecentes.
Os administradores de clínicas particulares reclamam da dificuldade de encontrar candidatos capacitados para as vagas abertas, e o serviço público já expandiu os investimentos para criar mais espaços destinados ao tratamento de narcodependentes. Só de 2002 até o ano passado, o aumento de recursos foi de 142%. O leque de especialidades nessa área é amplo, já que os procedimentos terapêuticos exigem uma abordagem integrada para que a recuperação e a ressocialização se tornem possíveis.
A formação e o interesse em atuar nesse tipo de atendimento é garantia de emprego certo, segundo José Norberto Fiúza, diretor da unidade ambulatorial do Grupo Viva no Distrito Federal — a instituição oferece tratamento a dependentes de drogas e álcool em diversas cidades do país. “Não há profissionais com a capacitação exigida para trabalhar em clínicas de recuperação. Sempre procuramos gente para aumentar nossos quadros e encontramos pessoas despreparadas”, diz o especialista em dependência química, formado pela Universidade de Berlim, na Alemanha.
Segundo Fiúza, as pós-graduações nessa área ainda estão concentradas em cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, mas os cursos de capacitação complementares podem ser encontrados com mais facilidade, inclusive na capital federal. Há ofertas nas próprias clínicas contratantes e por meio da Secretaria Nacional Antidrogas (Senad), que desenvolve projetos de qualificação desde 2003. O interessado pode optar pela modalidade presencial ou a distância. Todos são certificados por universidades brasileiras, parceiras da Senad.

Perfil apropriado
Os salários para quem se interessa em atuar no tratamento de narcodependentes são atrativos. Podem variar de R$ 2 mil a R$ 3 mil por 20 horas de trabalho para os que têm apenas a graduação e chegar a R$ 15 mil para quem investe em uma pós-graduação em dependência química. É o caso da cubana Bárbara Frejomil Fernandes , 61 anos. Formada em psiquiatria e com especialização na área de dependência química, além de ter feito diversos cursos no setor, ela afirma que assim que chegou ao Brasil conseguiu emprego. “Isso foi há 10 anos, e a situação já era grave. Aprendi muito aqui. Hoje, trabalho na Mansão Vida e tenho a minha própria clínica”, conta.
Para ela, o trabalho que presta visa reduzir um dos maiores flagelos da sociedade: a droga. Ela se apaixonou pelo cuidado com os usuários desde a faculdade, em Cuba. Foi lá, com as aulas práticas, que fez uma descoberta: para cuidar de dependentes químicos, não basta ter qualificação, é preciso ter perfil. “Decidi nunca mais desligar meu celular quando estava em uma viagem de férias e uma mãe desesperada me ligou dizendo que a filha havia tido uma recaída e que ela não sabia o que fazer. Mesmo sem estar presente, consegui acalmá-la e orientá-la naquele momento de angústia”, relembra Bárbara.
A dedicação integral é uma das características imprescindível para esses profissionais. Além disso, é necessário ter preparo psicológico e treinamento específico para não entrar no “jogo” dos pacientes. “Eles fazem drama, tentam nos convencer. É preciso ser forte”, relata José Norberto Fiúza. Saber lidar com a frustração constante e com o preconceito também são requisitos para quem escolhe essa carreira. “O tratamento pode dar certo ou não. O médico ou especialista precisa estar preparado para isso. Ele não pode chegar cheio de opiniões formadas, sem aceitar isso ou aquilo. Nessa área, é cada dia uma história diferente”, ressalta Fiúza.

Legislação a favor
Conheça alguns projetos de lei que estão em tramitação e que podem beneficiar o mercado de trabalho do segmento

PL nº 4981/09
Prescreve medidas para a prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de dependentes de drogas e estabelece normas para repressão à produção e ao tráfico de drogas

PL nº 5857/09
Autoriza o Poder Executivo Federal, em articulação com os municípios, a criar clínicas públicas para dependentes químicos de álcool e de drogas

PL nº 6073/09
Cria o Registro Nacional de Dependentes de Drogas Ilícitas (Renadi) e, entre outras coisas, fixa o tratamento especializado compulsório para quem adquire drogas para consumo pessoal, podendo o juiz declarar o agente temporariamente incapaz para cumprimento da medida judicial

PL nº 6644/09
Esclarece sobre a obrigação de o Sistema Único de Saúde dispor de unidades especializadas no tratamento, na prevenção, na pesquisa e no combate à dependência química

PL nº 6684/09, do Senado Federal
Suspende as exigências mínimas para o funcionamento de serviços de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso de drogas, nas localidades com mais de 100 mil habitantes, até que sejam instalados serviços próprios.